Subversos

Derrames cerebrais com vida própria

sábado, abril 22, 2006


POEMA MEDÍOCRE 13

No descampado as folhas secas.
Na floresta as folhas mortas.
Pássaros de encontro ao céu
em gritos.

Lata de gasolina na mão.
Murmúrio seco, imperfeito o traço.
Pássaros de encontro ao céu
em sangue.

Fausto encenando a morte.
Amor de passagens rápidas. Rios.
Pássaros de encontro ao céu
em gritos.

Amor de passagens rápidas. Rios.
Não morrendo por crescer ainda. O fruto.
Pássaros de encontro ao céu
em sangue.

Fausto encenando a morte.
Não morrendo por nascer ainda. O traço.
Do teu rosto.

Pássaros de encontro ao céu
em gritos.

RMM

segunda-feira, abril 17, 2006


POEMA MEDÍOCRE 12

Há uns quantos de dias
apenas
falei pela primeira vez sobre o vício, a doença,
o desvio do traço do meu demónio privado

na esplanada, esfregando os olhos ao calor como
uma outra coisa qualquer que
aqui estivesse mas não

está.

Acredita: não sou o teu sol, mas falo do meu coração.

Agora.

Que o peso da tua ausência se torna indiferenciado e
já não
me verga os ombros.

Há uns quantos de dias apenas falei
pela primeira vez sobre o desvio do sangue e a morte
dos versos que
não existem e não há cura
que a posologia dos medicamentos
não enquadre.


Foi só.
Há.
Uns.
Quantos de dias.

Apenas a mão aberta sobre os meus ombros,
os raios sobre os meus dedos.

Acredita: não sou o teu sol, mas falo do meu coração.

Foi só há uns quantos de dias apenas falei pela primeira vez sobre a doença o desvio os dias sem calendário de folhas «assinaladas e assassinadas» a negro e a vermelho e a vermelho e a negro acredita não sou o teu sol mas falo do meu coração acredita não sou o teu sol mas falo do meu coração acredita não sou o teu sol mas falo do meu coração «ele transformou a água em vinho» cantam no rádio «ele caminhou sobre as águas» gritam as vozes «ele transformou a água em vinho» cantam as vozes «ele caminhou sobre as águas» gritam do rádio espera-te a cruz e o deserto e a morte e o arrependimento acredita não sou o teu sol mas falo do meu coração não te levarei ao altar não erguerei a voz no púlpito não o levarei pela mão não o erguerei nos braços acredita não sou o teu sol mas falo do meu coração e a voz que se ouve diz que não
reneguei

o diabo.


RMM

terça-feira, abril 11, 2006


POEMA MEDÍOCRE 11


O cavalinho de madeira ainda
baloiça sobre a estrada como se
a infância não fosse um dos
teus
fantasmas.

Acelerei naquela noite sem saber
se ir-me-ia matar nas tuas
mãos
abertas sobre o meu
corpo quente minutos depois do copo frio levado aos
lábios abertos, sujos do chop soy
de vaca louca ou de galinha
constipada de H5N1.

De certeza que o barco de papel não resistirá à incerteza dos
dias naufragados no calar da tua
distância
quando num carpir de
bêbedos os marinheiros choram
o afogar das suas sereias.

Foi o teu fantasma, abraçado ao teu colo,
amamentando a serpente no teu peito.

Foi o teu fantasma o brinquedo, o pente o céu azul…
Foi o teu fantasma o bibe, o guardanapo o estojo com a abelha Maia…
Foi o teu fantasma o Rato Mickey e o Pateta, o Demolidor e o Homem de Ferro…
Foi o teu fantasma a viola partida de cinco cordas, a Clarabela e o céu azul…
Foi o teu fantasma aquela que amaste numa noite no teu carro pulsando o calar dos pulsos no calor da madrugada inquieta…
Foi o teu fantasma o «animal selvagem que no silêncio te procura»… (e o céu azul também)

Foi o teu fantasma…
(continua a sê-lo)

Foi o teu fantasma…

…embora hoje tu saibas
que não se domesticam os mortos.

RMM

sexta-feira, abril 07, 2006

Os Açores na tristeza



A alva espaçonave da rua
Os alicerces sem vista interior de pedras regionais da aldeia
Equívoca viga sustentada pelos pés na terra, abertos os ouvidos
O desembaraço colocado pelo calhau branco de terror
Os normais do Prazer do Menino do sumiço casual
Faz cócegas o olhar quando nada é proibido na planície dos beijos
Deslizam os príncipes sob o sol matinal no telhado a reflectir a luz seca
Eu cá afasto-me e cheira-me que a rua se vai apagar!
A venda ao estrangeiro, o dia se eleva, não se eleva o dia

No início a escotilha dos meus ouvidos saía para a terra
A minha escotilha nua e insensível que nada ganha
Proíbe explícitos continentes nos trágicos quintais
Expulsa a terra inteligível sob os elevadores roubados
Traz o sentimento de que a nave está perto das barracas alheias

Exulto e desperto a terra que não me tem
Acordado, firme, agitado, eu
Aproximo-me da nave sem dar atenção mas ouvindo os meus ouvidos
Ouço a escura rua com ouvidos desatentos

Os ouvidos me abrem... abandonados ali ao lado da rua negra...
Planto a minha boca sem que o vão interior se feche no betão
Mas eu, depois de depois do escuro escurecido e vazio do jardim
Ainda tenho frio apesar de me afastar sozinho e de fechar também as portas
Sinto que estou num corpo de éter e de reflexos inconsistentes
As naves aterram por cá às vezes e ficam de vez

As terras baixas temem que a fraqueza atrapalhe o pensamento
Elas têm prazer em sentir o que tenho aqui
Amadureço e proíbo o desmatamento desertificante aos ladrões!
A ausência das rochas fora da essência das rochas roubadas!
A compreensão da morte não podia deixar de ser diferente de tudo
Faz falta o começo, mas não faz falta o começo que faz falta sem razão

Não faz falta o erro que desperta a minúcia e nunca é pior
Eu estou na espaçonave, mas as espaçonaves não são aeronaves - as espaçonaves ficam

A estátua interior faz sentido porque nem me passou pela cabeça
É daí que chegam as naves que vi... que sei que vi! Que visão!
No céu as visões impedem as camas de se deitarem sem querer

Lá no meio quero ouvi-las a desaparecer para se desfazerem sozinhas
É bom impedir que as rochas se ausentem como se houvesse algo que eu quisesse desfazer
Não reparo que algumas delas são rochas menos originais

Estou a ver rochas familiares compreensivelmente rectas e inconscientes
Ocultadas por uma porta, no apartamento das rochas vibrantes
Vejo aviadores de gritos vivos no caos reencontrado
O caos foi lido e parou num lugar incerto
À vista de todos, a noite pensa que ficámos em terra
Mas as naves sim ficaram

Penso que a inconsciência diante da minha barriga é o que me dá prazer
Assisto à partida do nada perante a hipótese
Ele carece de oito não-seres mesmo que o corpo não seja o sétimo
E mesmo que ele tenha mais que nove, para o corpo não há um oitavo
Não há que roubá-lo a ninguém

O corpo e o cérebro não estão à volta da inconsciência colectiva da desagregação do outro que não me tem
Pensamentos avulsos, as minhas distracções perseguem-me

Por isso fecho as portas
Aquela manhã da porta das janelas escancaradas terminou

A minha inconsciência central reatada
A mim ninguém terá de ver com bons olhos
Desde a noite em que a minha hiperactividade desapareceu
No meu corpo definha um entusiasmo, indiferente, visionário

Acende-se o Inverno, é cedo, não está deitada na cama
A alva espaçonave da rua obscura

quinta-feira, abril 06, 2006


POEMA MEDÍOCRE 10


Falas do futuro negro
da falta e a da ausência
da queda do
equilibrista desequilibrado
sobre os cacos de vidro,
fosco,
o reflexo no espelho
partindo os traços
desesperados do teu
rosto.

A queda já foi.

Acredita.

Hoje, ontem… a queda já foi e
o futuro é este
sobre os cacos

apenas,
a carne rasgada das
virgens trágicas bebendo

o vinho amargo dos
homens dóceis.

Se para além do passado fores para além da vida: é preciso ir para além do futuro se quiseres ir para além da morte.


Sangue para mim são uvas.


RMM

quarta-feira, abril 05, 2006

Apenas despertar



Com toda a certeza proíbo
A calmaria das sombras
Quando não há vozes na sala

Oiço sempre
O teu choro quando
Perto daquele lugar
É noite... e sinto-me mal
Cuidado tu!

Despista a minha vigília
No tecto param
A escuridão e a ciência
A tranquilidade quadrada

Com certeza o tecto é feito
Da minha vigília perdida
Na sexta megalópole
O teu tecto é que já acabou

Nenhuma fealdade se eleva
(Apaga-se a si própria)
Apagadas as trevas
Acendidas as tristezas

domingo, abril 02, 2006

As damas à água



Dia 7 de Dezembro do ano 210 a.C.

A tua cor permanece em mim e tranquiliza-me
Distante é a neutralidade. Debaixo dos nossos pés a lisura

Meus pesadelos inofensivos saem vencedores!
Azedo e elevado levanto voo

A princípio a tua estranha pintura interior não se esvai
Mas a inocência cautelosa a amortece e apaga

A tua cor permanece em ti mas eu desejo-a
Distante sumiço o teu. Apagado o chão debaixo dos nossos pés

Com raiva ou indiferença - vou atrás a gritar
A lisura possível apaga o chão debaixo dos nossos pés

Desobrigo-te... a ti e à tua cor mutável
Os minutos congelam. Desobrigo-te

A inconsciência esporádica dos pesadelos ligeiros
imobiliza o teu rancor e a tua frieza


Estás livre...