Subversos

Derrames cerebrais com vida própria

quinta-feira, dezembro 29, 2005

Lá vai ele sem um pé



Andava às voltas às vezes de forma original
Era dia de trabalho
E como ele era um bom pai
Um velho que saiu da miséria

Não me obriga a ouvir os factos
Meu pai bondoso ergue-se do fundo esquerdo do poço
Lá vai ele sem um pé

E às vezes andava às voltas de outra forma
Era dia de trabalho
Destapou-a de postes e coberturas sintéticas
E morderam-se até começarem a funcionar

Mas apagou-a com uma borracha
E começou a pensar numa desconhecida
Lá vai ele sem um pé

E às vezes andava às voltas de outra forma
Era dia de trabalho
E como ele era um bom pai
Um velho que emergiu da miséria

Mas não me obriga a ouvir os factos
Meu bom pai canhoto ergue-se do fundo do poço
Dos gritos dos dias úteis

terça-feira, dezembro 27, 2005

Tão negro como as minhas férias



Nenhum cravo parecia
um nítido estagnar de conchas
Ontem ouvi com a razão
Os corpos suaves das plantas?
Os cérebros dos anciãos?
Fogo escuro? Sol antigo?
A tempestade do medo
de que todos se esquecessem
e as ideias acordadas
fossem estes pragmatismos
Se a vida era a vida...
quando os arcos encerravam desamor

Isto era a razão
Isto era a culpa
quando a realidade era laranja
e as cercas estavam no ar

Este balde de água apagou-as
E acabou o silêncio
quando se acendeu a angústia
do Mal que miava bem longe

O Mal que seguramente existia
na falsa religião
desagregou-nos com a alvorada
Quem nos molestou com a desvida
disse-nos com ódio a verdade
a solidez da certeza

Sempre impossível
como Lúcifer aprendeu
é a guerra contra os outros
Outros cravos menos manchados
E o mesmo sol de antes
quando nos trouxe a vida
foi o sol que se evaporou
e fez uma fralda com ela

Os pés dos minutos
fugiam do corpo
E o sol elevava-se sobre os cravos
da sombra que os fez nascer

E e luz condensou
raios de dentadas e verdades
O sol do corpo não tinha
o corpo evaporado debaixo dele
Depois teve as pupilas
que dele evolaram
E eram cravos negros
- embora não tão negros como as minhas férias -
Alguns cravos são negros
na foz do acto

Os esquecimentos foram secando
e o prazer da minha alegria
restaurou-me as barbatanas na sombra
no corpo da secura
E a minha auto-estrada encontrava-se
num nítido estagnar de conchas
quando ontem ouvi com a razão
gritos de Primavera

sexta-feira, dezembro 23, 2005

O ardor no rabo para gozar de um direito



Parti sem os que já foram ao encontro que é a morte
Se é uma paralisia sem significado
Apago facilmente a cerveja anterior
É triste esta completa ignorância do fim
É mau ir embora a fazer prosas e a chorar em negrito
É cedo para ser a recta que seria noutra altura, involuntariamente noutra altura
Estou vestido e elevo-me do fogo da minha realidade
Estou preso pela política caótica e nua
Foi embora o medo de ficar aqui e eu nem desconfiava que iria
Estarei em todo o lado sem uma minuciosa indecisão
A asfixia é pior passados os dias dos desencontros presentes
Que matadouro o ter de desconfiar dos outros
Estar presente é sair da cidade negativamente
Ou o ardor no rabo para gozar de um direito

quinta-feira, dezembro 22, 2005

Estou livre da tua queda



O desnorte feito num único horizonte
A trama do teu azar
No vácuo da ignorância
Não sou o teu fim estático
Soltou-me o ter de ficar
É que a aranha medita
- és uma criança e ela o sabe -
Pensa o que vais ser na velhice
Cria o desnorte por não agires
Na teia do teu acaso
A teia!...

terça-feira, dezembro 20, 2005

Chorai pela rua que congela!



O espaço foi-se embora. Esqueceu o ódio na desgraça
E no que restou perdeu o desalento minguante
Mas foi uma pena que o corpo tenha ficado
E largado uma alma com a boca aberta por instantes

Dando cambalhotas para a frente num desgosto gradual
Deixou de reconhecer-nos num poço que apareceu depois
E pouco a pouco o bebé perdeu a nossa chegada
Ainda que tivéssemos vindo até ele com um pulo nunca visto

Chora por ti próprio, e nunca escrevas com os pés
Nada de saltos demorados nem bocas tristes na multidão
Chegaram os ossos negros donos do recém-nascido
E ouviram por entre as portas da capa do Corão:

Pouco a pouco na sufocante chuva requentada
As excepções são tão inúteis como as alturas
Raramente corremos apressados para o despertar e para a vida
Para o neto que acaba de nascer

segunda-feira, dezembro 19, 2005

Se os gritos te incomodam arranca-os da goela



Beija o velho que te beijou
Beija o velho que beijou a moça

Não te soltes não te libertes
Isto não dura pouco nem diverte
Elefantes em terrenos caros
A ceifa para quem a semeia

Manda em quem obedece
A ceifa para quem voa

Mal se ganha para chegar a horas
Que tragam o dia inoportuno
A fugir pelo crepúsculo
A ceifa para quem se ri

Manda em quem obedece
A ceifa para quem voa

E fica fria
Regela congela
Faz por não desmerecer
A ceifa para quem se encolhe

Voa e revoa
Ainda tem um perfume divino
Manda em quem obedece
A morte para quem voa

Vem do velho para a moça
Vem do velho para a rapariga

sexta-feira, dezembro 16, 2005

O buraco negro



A mulher está condenada a pari-lo
O buraco negro
Cria a morte
Sem parecer um homem sóbrio tira espaço à mulher para a sentenciar
É ignorado pela massa desatenta em calabouços de celofane
Mas cheira bem
Imagina que vai implodir aqui, agora e porque lhe apetece e traga a sinistra eternidade
Usa ponderadamente a vergonha de ser abismo
Exalta extremistas e galáxias, e paralisa sem a faca da liberdade
Vem do Sol, grita e pára
Exige que todos cumpram a obrigação de viver com saúde
É saúde
Apaga estagnações infrartesanais para atacar os vanguardas e os decadentes
Vai divertir-se sem as ciências exactas, líquidas, positivas
Extrai o universo da guerra de um cálice de magnésio empobrecido
É talibã e odeia o fedor das Ilhas Kermadec
Passa ao lado da língua áspera dos críticos
É público e aberto a todos
Não se assume como estaca do crime chapéu do ódio demónio da cizânia
Proibiu a Deus que amaldiçoasse o Belzebu e vice-versa
É obrigado a orgulhar-se para ser posto em causa
É verde
Sempre destrói gatinhos no jardim, às vezes na cozinha
Inspira razão e humildade social
Engole a vida com frutas
Estica uma ou outra cauda na sua pontuação translúcida
Ressuscita ao fingir que abala para dar à luz
Não quer adormecer apáticos doentes, nem sedentários integrais
Faz dormir a todos apenas quando o provocam
Pertence unicamente a um convento de freiras
É um escravo do barulho monocórdico de cinco varas de irídio e ósmio aquém da perfídia
É uma cicatriz nas costas do Outono
É um colírio na cegueira da morte e penetra
Petrifica enquanto murmura: eu sou a luz
Ofende as fraquezas corporais, as espaciais e só
Cura os velhos depois de terminar de morrer
Deixa de curá-los quando chega a morte
É divertido, é de uma alegria banal
Goza de regeneração restauradora, de boa memória, de hemo-oxigénese, de logoparcimónia
Ruralizou as cigarras que o cristalizaram em diplomacia local
Tem quatro microbares de calor por 14 de nobreza
Trabalha nos dias úteis
Ri-se nos dias de sol, estende-se ao lume
Divide com palavras os alheios e é alheio às palavras
Nunca ninguém sente a sua falta para evadir-se
É quadrado como uma cama quadrada... e redondo
Não vem de nenhuma futebolada e só se levanta por dentro
Diz a verdade e chora com todos os buracos
Estava no topo da montra, mas não estava onde estava
Ontem lembrou-se e cumpriu a promessa de ser pior
É caro tem tempo e tem por onde ir
Acorda na segunda-feira assim que os pássaros desabam
É elegante de tão prazenteiro a acariciar o pescoço
É inteligente é delicoalegre é vazio de linhas rectas
É a matéria-prima tosca de uma fábrica proeminente
É uma raiz de tranquilidade a apaziguar os sonhos dos coveiros

segunda-feira, dezembro 12, 2005

Assim silenciosamente colapso as minhas armas



Tão delicadamente afago as pacíficas pirâmides de A.
Faço até com que os muros sepultem os vivos foragidos das conversas
Deixo que o fedor do velho seja sentido com o doce aroma da filha
Cuidado com os jovens que se escondem dos velhos
Cuidado com os extrovertidos
Cuidado com os risonhos e os ateus
Não faço guerra
Avanço com a futura realização
Calem-se! Calem-se, vozes!
Desabem, armas! Desabem!

Ergo então umas pirâmides menos lentas, menos leves
Implodo uma implosão mais doméstica
O réu senta-se no relvado para esconder a bolsa das testemunhas!
Os calados calam-se! O ouvinte deixa de conseguir ouvir!
Todos os esbanjadores que esbanjam à noite
Todos os errantes e trovadores
Deixam de o ser!
As mesas são desfeitas pelos despertos nas manhãs selvagens!
Todos os insomnes querem acordar nelas
Na paz do campo
Sob o silêncio das patas nos caminhos de cabras
Calem-se! Calem-se, vozes!
Colapsem, armas! Colapsem!

Tão calmamente me aconchego e aparafuso a guitarra
Como de forma grave implodo as minhas armas
Também o empresário tumultuoso pode entrar em pane
Destruindo a sua cidade e espalhando a sua fortuna
Deixemos o viúvo se alvoroçar
A tristeza pode atingí-lo e à sua amante
Na casa onde o mestre está a ensinar
No estádio berrante, e junto à massa macedónica
Por baixo das portas
Por cima das janelas
O desabamento de uma fraqueza piedosa
Calem-se! Calem-se, vozes!
Implodam, armas. Implodam!
Calem-se! Calem-se, vozes!

domingo, dezembro 11, 2005

Novo crepúsculo branco



O novo crepúsculo branco está a ir-se embora

Todos sabem que é verdade
Ninguém sabe que é uma lenda
Sobre o poço das Ilhas Pitcairn
Não tenho um conto de bruxas
É um lugar onde tu te paralizas
Antes de teres a tua depressão
Por emergir no novo Índico
Eu nunca fico triste

Novo crepúsculo branco
O novo crepúsculo branco está a ir-se embora

Mas ele era rafeiro e mau
Ela foi possuída por milhões
Ela conseguiu libertar o tempo
Ela conseguiu procurar a mentira

Ela foi capaz
Ela conseguiu deitar-se
Na estrela Nestlé
Arranquei-lhe o coração

sexta-feira, dezembro 09, 2005

De ares nacionais, de ares distantes



A bendita terra batida nos seus arcos
Recebeu com eles o antídoto-vida
O filho do servo depois de muito tempo
Asfixiou

O rei nasceu da cabeça
Do seu piedoso escravo
E na luz do palácio calmamente
Firme andou e levantou voo defensivo

Afundou em lagos escaldantes
E o sangue leve, na sua coroa envergonhada
Uma raiz com pontas nítidas à noite
Originou o bagaço da vida

E à noite quando levava o antídoto
O rei insubordinadamente estagnou
Na cidade do anjo purificante
Onde um andróide recebeu uma mulher

Recolheu no mar e na água refrescante
Para algumas delas, o sol desinfectado
As suas raízes em bando imóvel
E intencionalmente solidificou uma onda

Para nadar por perto inocentemente
E sempre vêm aquelas brisas
E um cão urbano reza por ele
E os peixes vem visitar-lhe a toda hora

Uma água opaca e leve
Amolece sob a luz matinal
E condensa de madrugada em sombras infernais
O antídoto está preso no seu linguajar

Verteu suor dos ossos durante um breve instante
E flores e raízes de vegetais vivos
Levaram-lhe na noite de festa
Os artifícios do mar esfomeado

Deitou-se como o vigiado pacífico ruidoso
Emagreceu, com toda a gente local
Num mar húmido e insonso
Na cidade revigorado e petrificado
Murchou

quinta-feira, dezembro 08, 2005

Os velhos odeiam os seus demónios



Os velhos odeiam os seus demónios
A tranquilidade, a diarreia
O lazer solitário dos saloios
A pureza e os sussurros
O rasgar das entranhas do lobo
Cheguei
Não é isso, menina?

Vai-te embora por cima do sol
Por cima do sol, por cima do sol
Para uma fundura rasa, rasa
Para uma fundura rasa
Vai-te embora por cima do sol

Nem podes imaginar o que ela pensa...
Foi por isso que me esqueci da sua face!
Deixa lá os pés, mulher
Deixa lá os pés
Foi por isso que me esqueci da sua face!
Esqueço-me
Esqueço-me, mulher
Carinhoso e afinado lobo de feira
O desinteresse dá-te um belo sabor

É isso! Tenho de estar sóbrio e humano
É isso! Tenho de ser realista e humano
Sem os meus factos que são totalmente coerentes
Onde fores uma escrava, serás a última pelo chão

É isso! Tenho de estar sóbrio e humano
É isso! Tenho de ser realista e humano
Para um ovo imortal o odor dos meus pés
Com licença, quero fazer música, conseguir que te divirtas
Homem sóbrio

quarta-feira, dezembro 07, 2005

Para postais de amizade



Para um único clone
sai um desenho
com um sujeito, uma prosa

É para eles!
De mim, o remetente
Que quereriam ouvir
Coisas profundas "o teu espinho, sol das tuas exo-trevas"?

E "para a amizade, para a amizade"
a amizade deles

Uma prosa de afecto
Foi o que eles me ofereceram

Um desenho

Sem os romanos à janela nem Metis na varanda



Esta futura mulher, mais antiga que Maomé
É uma bárbara do progresso parcial
Não tem nenhum domínio naquilo
Nem profissionalmente, não acredite
Jamais actua para a Bíblia
Nem eu tão pouco...

segunda-feira, dezembro 05, 2005

Homem apático e inactivo



Carecemos de mais morte que a morte
Imortalmente vendemo-nos
O espaço, o corpo, a destruição, a vida
Ela é a outra que é o mesmo que ela

A família que se extingue
Rejuvenesce, imutável
Num fim, sem parecer que ignora
Nem a metamorfose do Unicórnio. Nem quem perece

O gosto que sente
Bem diferente dela
De uma raiz negra, levanta voo, já
O homem apático e inactivo que, rastejando, cristaliza nas profundezas

sábado, dezembro 03, 2005

Não tenho o Ar nem o Inferno



Vou ficar alegre, vou-me iluminar
Para sentir muito mais do que o cheiro das vossas acções
E vou sentir o cheiro do Ar
E começar a sentir o cheiro dos postes e das pedras
Se eu não fizer nada
Isso para mim é essencial
É importante que assim seja
O ar ignora as plantas e os alçados que o possuem
Tudo faz tudo
Eis o que aquilo faz com isto

Como se me perdesse com uma mão desperta
Longe desse momento gosto de mim, e dou-me agrados
A responder nada
Nunca respondo aquilo desde que não me perca
É isto o que o meu tecto faz com a minha luz
O que não está relacionado com gestos animalescos
Imagino porquê, por tudo
E retiro-me sempre a chorar, com toda a gente
Não tenho a certeza de que os actos não sejam minimamente fingidos

sexta-feira, dezembro 02, 2005

Continente real



Será que fico por aqui?
Continente real,
Hmm, hmm, Terra Mãe?
Isso que não estás a pensar por lá!
O vosso homem alugado dança para os bichos por dinheiro

Será que fico por aqui?
Continente real,
Não me viram porque eu estava quieto em casa,
Aquele antro de prazer

Será que fico por aqui?
Continente real,

Não há submarinos mensais,
Irmão grande, vai-te embora sozinho.

quinta-feira, dezembro 01, 2005

As aventuras de uma recta perdida



Sãos e entretidos
escondiam-se da lua
oito jovens príncipes.
O betão em redor
de um complexo de ferro
ficou parado e expandiu-se.

Longe da praça
uma foz interioriza
os seus gritos em redor da areia.
E a recta, turbulenta
auto-estrada dos nobres,
popular e vaidosa,
despreza a natureza-morta.
A mundana agitação
dos artifícios
arrancou-lhe descrédito e cepticismo,
mas lembrou-se do orgulho
das suas cidades, e recusou
provar o início do improviso.
Uma plenitude reconfortante
destapa os cemitérios,
e as moscas oprimem
os seus postos de algodão
esferas em vidro fosco
de terra
As pedras comprimem
as suas pernas no ar.
Não há velhice salgada
no breu sacudido.